sábado, 14 de janeiro de 2012

A Síndrome da Pós-Poliomielite - SPP

A poliomielite foi um dos maiores flagelos do mundo no século XX, não apenas porque abreviou diversas vidas, mas principalmente por ter criado um número enorme de crianças e adultos com seqüelas e incapacidades variadas.

Hoje, para muitas pessoas, a palavra "pólio" ou "poliomielite" é apenas o nome de uma vacina ou de uma doença do passado, a maior parte delas não faz idéia do caráter devastador que a poliomielite assumiu no Brasil e no mundo inteiro ao longo do século passado. Em 1952, somente nos EUA, mais de 50.000 pessoas foram afetadas, sendo que cerca de 6.000 delas vieram a falecer.

Só com a introdução da vacina injetável, produzida com o vírus morto da pólio e desenvolvida por Jonas E. Salk, em 1955, e da vacina oral com o vírus vivo atenuados, desenvolvida por Albert Sabin seis anos mais tarde, iniciou-se o combate efetivo desta doença.

No Brasil, devido à falta de registros precisos, é praticamente impossível identificar o número de pessoas atingidas. Somente a partir de 1968 foi implantado um sistema de notificação semanal de algumas doenças transmissíveis, entre as quais, a poliomielite.

Assim, hoje se sabe que, entre 1968 e 1971, foram notificados 7.458 casos de poliomielite no Brasil. É fato notório que nessa época já havia sido introduzida em nosso país a vacina desenvolvida por Sabin, mas, mesmo assim, no final década de 1970, depois da Índia, o Brasil era o país que registrava o maior número de casos de poliomielite em todo o mundo, segundo dados da OMS (Organização Mundial de Saúde), publicados em 1979.

Ao longo da década de 1980, felizmente a doença foi erradicada do Brasil e, na década seguinte, do continente americano, embora ainda seja uma doença endêmica em países pobres, como a Índia e alguns países africanos, por exemplo.

Como se contrai a poliomielite

A infecção ocorre por via oral, quando da ingestão de água ou alimentos contaminados. A transmissão é mais comum nas regiões de pior controle sanitário, estando claramente associada, nos dias de hoje, às condições sanitárias locais e ao nível sócio-econômico.

A ampla maioria das pessoas contaminadas não teve nenhum sintoma ou apenas apresentou febre e desarranjos gastro-intestinais durante alguns dias. O poliovírus se reproduz nos tecidos linfáticos da garganta e intestino, viajando no sangue para todas as partes do corpo. Apenas em 1% a 2% das pessoas infectadas o vírus invade o sistema nervoso central e produz o quadro típico de sua forma paralítica aguda, caracteristicamente assimétrica, flácida e podendo inclusive causar insuficiência respiratória.

Após a instalação da paralisia, a pessoa afetada tem uma recuperação espontânea, durante a qual se observa um gradativo aumento da capacidade funcional. Essa fase de recuperação é seguida de estabilidade funcional, na qual o paciente não nota ganho ou perda frente a suas incapacidades durante décadas.

Mas, e os sobreviventes da poliomielite?

A poliomielite era tida pela medicina como uma doença neurológica não progressiva, estática. Acreditava-se que após a reabilitação e a reeducação a maioria dos sobreviventes atingiria um patamar de estabilidade funcional e neurológica que duraria indefinidamente. Contudo, no final dos anos 1970, começaram a vir à tona relatos de pessoas que haviam se recuperado da poliomielite paralítica décadas atrás e que estavam desenvolvendo problemas de saúde inesperados e restritivos, como:

- fadiga incontrolável;
- fraqueza muscular;
- dores musculares e de articulações;
- distúrbios do sono;
- maior sensibilidade à anestesia,
- maior sensibilidade ao frio e à dor;
- dificuldade de deglutição e respiração;

Esses sintomas ocorrem cerca de 30 a 40 anos após o ataque do vírus da poliomielite em até 80% dos paralíticos e, eventualmente, em sobreviventes não paralíticos. Visto que havia pouca informação sobre mudanças neurológicas tardias em sobreviventes da poliomielite, a reação inicial dos médicos era a da negação do problema.

Estima-se que existam cerca de 20 milhões de sobreviventes da poliomielite em todo o mundo. Essas pessoas, sofrendo os seus efeitos tardios, finalmente começaram a atrair a atenção da comunidade médica, e, no início dos anos 1980, foi cunhado o termo "Síndrome Pós-Poliomielite". O importante é estarmos atentos ao fato de que muitos ignoram esta possibilidade de uma complicação tardia, tanto os médicos como os próprios sequelados.

O que causa a Síndrome Pós-Poliomielite - SPP?

A hipótese mais aceita é a de que a Síndrome Pós-Poliomielite não é causada por uma nova atividade do polio-vírus, mas sim pelo uso excessivo dos neurônios motores ao longo dos anos. O vírus pode danificar até 95% dos neurônios motores matando pelo menos 50% deles. Sem estes neurônios os músculos não respondem aos estímulos, o que provoca a paralisia e a atrofia. Embora danificados, os neurônios remanescentes compensam o dano enviando "ramos", como linhas de telefone extras, para ativar músculos que ficaram órfãos quando seus neurônios foram mortos. Esses "ramos" desenvolvidos pelos neurônios agora estão falhando e morrendo pelo excesso de uso, causando fraqueza muscular e fadiga. O uso excessivo destes músculos enfraquecidos causa a dor muscular e das articulações, além da dificuldade de respiração e de deglutição em casos mais raros.

Há tratamento para a SPP?

Os sobreviventes da poliomielite necessitam "conservar para preservar", ou seja, conservar energia, parar com o excesso de uso e com o abuso de atividades para, desta forma, preservar sua capacidade funcional. As estratégias para o tratamento da SPP incluem um tratamento multidisciplinar, com profissionais especializados e que conheçam a síndrome, como, por exemplo:

- fisioterapia (principalmente a hidroterapia);
- terapia ocupacional, com técnicas de conservação de energia;
- modificações do estilo de vida;
- aconselhamento psicológico;
- perda de peso;
- uso de auxiliares de marcha (aparelhos, bengalas, muletas, cadeiras de rodas);
- medicação específica para os novos problemas musculares.

Conscientização e exercício da cidadania

Preocupados com a ocorrência da SPP no Brasil, fenômeno que pode se tornar uma questão de saúde pública em nosso país, a ABRASPP – Associação Brasileira de Síndrome Pós-Poliomielite vem procurando chamar a atenção de alguns setores da sociedade para o problema, objetivando aprimorar o desenvolvimento das pesquisas científicas, as medidas de tratamento e a melhoria da qualidade de vida dos pacientes.

Por isso julgamos fundamental a divulgação deste documento, especialmente aos profissionais de saúde, administradores públicos, meios de comunicação e, principalmente, aos sobreviventes da pólio e seus familiares.

Para tanto, nos colocamos à disposição de todos pelo e-mail abraspp@abraspp.org.br e pelo tel. (11) 6965-5865 para que possamos unir esforços com todos que queiram buscar soluções e conhecer melhor a SPP.

A CARTA PÓS-PÓLIO

Fatos básicos sobre PPS para médicos, família e amigos de sobreviventes da pólio.

Dr. Richard L. Bruno

Presidente da Força tarefa internacional de pós-pólio Diretor do The Post-Polio Institute e The International Centre for Post-Polio Education and ResearchEnglewood (NJ) Hospital and Medical Center, EUA.

O QUE SÃO AS SEQÜELAS PÓS-PÓLIO?

As seqüelas pós-pólio (PPS, Síndrome pós-pólio, efeitos tardios da Poliomielite) são os sintomas inesperados e freqüentemente restritivos, como fadiga incontrolável, fraqueza muscular, dores musculares e de juntas, desordens do sono, maior sensibilidade à anestesia, ao frio e à dor, bem como dificuldade de deglutição e respiração, que ocorrem cerca de 35 anos após o ataque do póliovírus em 75% dos paralíticos e em 40% de sobreviventes da pólio “não paralíticos”. Há aproximadamente 2 milhões de sobreviventes da pólio na América do Norte e 20 milhões de sobreviventes da pólio no mundo todo. A existência da PPS tem sido documentada por artigos em muitas publicações médicas, incluindo The Journal of the American Medical Association, o American Journal of Physical Medicine and Rehabilitation e The New England Journal of Medicine.

O QUE CAUSA A PPS?

A PPS é causada por “abuso de excesso de uso” durante décadas. O póliovírus danifica 95% dos neurônios motores da base do cérebro e da medula espinhal, matando pelo menos 50% deles. Na prática, cada músculo no corpo é afetado pela pólio, pois são os neurônios de ativação do cérebro que mantêm o cérebro acordado e a concentração da atenção. Embora danificado, os neurônios remanescentes compensam o dano enviando “ramos” como linhas de telefone extras para ativar músculos que ficaram órfãos quando seus neurônios foram mortos. Esses ramos desenvolvidos, de neurônios danificados pelo vírus da pólio, agora estão falhando e morrendo pelo excesso de uso, causando fraqueza muscular e fadiga. O excesso de uso de músculos enfraquecidos causa dor muscular e das juntas, bem como dificuldade de respiração e de deglutição.

COMO A PPS É DIAGNOSTICADA?

Não há nenhum teste de diagnóstico para o PPS, nem mesmo o eletromiograma (EMG). A PPS é diagnosticada pela exclusão de todas as outras causas possíveis para os novos sintomas, inclusive a respiração anormal e o tremor muscular que, com freqüência, incomodam o sono dos sobreviventes da pólio, a tireóide lenta e a anemia. Outras patologias neurológicas ou musculares quase nunca são a causa dos sintomas da PPS.

A PPS OFERECE RISCO DE VIDA?

Não. Mas em razão da ativação dos neurônios no cérebro danificado os sobreviventes da pólio são extremamente sensíveis e necessitam de doses menores de anestésicos de gás e intravenosos e de medicamento sedativo. Os sobreviventes da pólio podem ter dificuldade para despertar da anestesia e podem ter problemas de respiração e deglutição, mesmo quando recebem uma anestesia dentária local.

A PPS É UMA DOENÇA PROGRESSIVA?

A PPS não é progressiva nem é uma doença. A PPS é causada pelo cansaço do corpo em fazer muito esforço tendo tão poucos neurônios ramificados danificados pelo vírus da pólio. Entretanto, os sobreviventes da pólio com fraqueza muscular não tratada perdem cerca de 7% de seus neurônios motores com excesso de funcionamento a cada ano.

HÁ TRATAMENTO PARA A PPS?

Sim. Os sobreviventes da pólio necessitam “conservar para preservar”, conservar energia e parar com o excesso de uso e com o abuso de seus corpos para preservar sua capacidade. Os sobreviventes da pólio devem andar menos, usar os dispositivos de assistência necessários – aparelhos, bengalas, muletas, cadeiras de rodas – planejar períodos de descanso ao longo do dia e interromper as atividades antes do início dos sintomas. Da mesma forma, como muitos sobreviventes da pólio são hipoglicêmicos, a fraqueza muscular e a fadiga diminuem quando ingerem proteínas no café da manhã e quando fazem pequenas refeições de baixo teor de gordura e alto teor de proteínas durante o dia.

O EXERCÍCIO NÃO É A ÚNICA FORMA PARA FORTALECER OS MÚSCULOS FRACOS?

Não. Os exercícios de fortalecimento muscular aumentam o excesso de uso. O levantamento de peso e “sensação de queima” significam que os neurônios danificados pela pólio estão se extinguindo. Os sobreviventes da pólio normalmente não podem fazer exercícios com grande esforço para condicionamento cardíaco. O alongamento pode ser útil. Mas, seja qual for a terapia, ela não deve desencadear ou aumentar os sintomas da PPS.

O TRATAMENTO DA PPS É EFETIVO?

Sim. O pior caso é a estabilização dos sintomas da PPS quando os sobreviventes da pólio interrompem o abuso de excesso de uso.

Muitos sobreviventes da pólio têm diminuição significativa da fadiga, da fraqueza e da dor quando começam a cuidar de si mesmos e todas as desordens de sono são tratadas. Entretanto, em virtude das experiências anteriores emocionalmente dolorosas relativas à invalidez, muitos sobreviventes da pólio têm grande dificuldade de cuidarem de si mesmos, de reduzir e, especialmente, de “parecer inválido” por pedir ajuda e pelo uso de dispositivos de ajuda às necessidades.

O QUE OS MÉDICOS, A FAMÍLIA E OS AMIGOS PODEM FAZER PARA AJUDAR?

Os sobreviventes da pólio têm passado suas vidas tentando agir e parecer “normais”. Pelo uso de aparelhos foram deixados de lado na infância e a redução das tarefas diárias ostensivamente abundantes é assustadora e difícil. Assim, os amigos e a família precisam apoiar as mudanças de estilo de vida, aceitar as limitações físicas dos sobreviventes e de quaisquer novos dispositivos de ajuda às necessidades. Ainda mais importante, os amigos e a família precisam estar dispostos a assumir as tarefas físicas que os sobreviventes da pólio podem fazer mas não devem. Os médicos, amigos e a família precisam conhecer a causa e o tratamento da PPS e escutar quando os sobreviventes da pólio têm necessidade de conversar sobre como se sentem sobre a PPS e sobre as mudanças de estilo de vida. Mas os amigos e a família não devem assumir o controle da vida dos sobreviventes da pólio. Lembretes gentis ou pressões bem intencionadas não forçarão os sobreviventes da pólio a comer no café da manhã, a usar uma bengala ou descansar entre as atividades.

Os sobreviventes da poliomielite precisam ser responsáveis pelo cuidado de seus corpos e pedir ajuda quando necessitam.

Se você teve ou não poliomielite, COPIE e ENVIE essa carta a seus médicos. Com a sua ajuda todos os médicos aprenderão sobre as causas e tratamento da PPS e darão aos sobreviventes da poliomielite o cuidado de que necessitam de forma tão desesperada. Obrigado!

Mia Farrow, sobrevivente da pólio
Thaddeus Farrow, sobrevivente da pólio

Co-presidentes da Campanha da CARTA PÓS-PÓLIO

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